O Mestre Miguel dos Santos

Me perguntam sobre minhas referências. Muitas vezes não consigo me lembrar de todas. São muitas contas para explicar o meu caminho tão inquieto e curvilíneo. Referências surgem desde as experiências da infância quando comecei o vício de desenhar por incentivo do meu pai, um desenhista desconhecido, Joaquim Fagundes me mostrava como era possível ter elegância ao desenhar letras, automóveis, casas e muitas coisas com exemplos simples que para mim seria uma lição estrutural para adquirir o poder conseguir ser feliz no melhor o que a brincadeira comum não tinha como me realizar. Anos depois eu passei em frente ao prédio feio do Departamento de Arte da UFPB, bem no caminho do consultório do Dr. Francisco Edward Aguiar que me tratava de uma asma insuportável. Entrei nesse lugar atraído por pinturas de artistas que nunca tinha visto, uma sala toda preta destacava as telas coloridas de muitos autores. Era uma coletiva, vi uma tela de Flávio Tavares que era um cajueiro lindo com figuras por entre as folhagens tocando nos cajus. Havia telas de João Câmara. Havia uma tela curiosa de Ramalho com figuras estranhas e um ritmo impressionante na estrutura entre as linhas do desenho desses personagens. Muitos outros artistas, poucas mulheres exibiam suas obras nessa sala. E lá entre tantas surpresas para mim que nunca tinha presenciado uma obra fora dos livros de arte que meu pai comprava e eram todo o meu universo possível e apaixonante, as pinturas tão estranhas quanto belas do Hieronymus Bosch com as cenas incríveis e perversas do “Jardim das Delícias Terrenas” uma das minhas preferidas, os desenhos incríveis de Albrecht Dürer, os impressionantes personagens camponeses de Pieter Bruegel e ainda as deformações nos corpos alongados que El Greco posicionava sob nuvens absurdas nas imagens bíblicas e dramáticas. Eu já estava cheio de informações da arte européia quando encontrei os artistas paraibanos com tanta valentia nas invenções tão rica de emocionalidade e proximidade às nossas verdades comuns. Mas havia um Miguel dos Santos. Esse eu encontrei depois por recomendação de Hermano José quando viu meus desenhos iniciais, dezenas de desenhos que carregava em uma pasta quando um amigo da escola - não me lembro o nome, me falou: _ Olha lá o Hermano José ele vai adorar ver os teus desenhos vamos ver o que ele diz do que você faz. Eu aceitei o desafio e fomos falar com Hermano que olhou atentamente todos os desenhos e me aconselhou procurar o Miguel dos Santos em Jaguaribe.Eu era muito jovem e inseguro. Pedi a meu pai para ir comigo conhecer o atelier do mestre. Mas ao ver as obras imensas e impactantes fiquei tão envergonhado que escondi os desenhos que deveria mostrar. Me lembro que meu pai perguntou a Miguel _Você acha que meu filho teria um bom futuro investindo na vida de artista? Miguel sabiamente respondeu: _O futuro da vida de artista é duro e incerto. Não se vive da arte e sim para a arte. Melhor ele estudar medicina ser um bom comerciante para garantir um bom futuro.. Hoje eu vejo quanta verdade havia naquele diálogo, Uma questão tão concreta que eu ainda hoje estou em processo de aprendizado presente, vivendo para a arte e sem expectativas de futuro.

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